El Niño: como a intensificação do fenômeno afeta o setor agrícola

No Brasil e no mundo, a força atípica do El Niño acende um alerta para os possíveis efeitos em várias áreas – incluindo a produção agrícola

Você certamente acompanhou (e sofreu com) a oscilação climática que vivemos nos últimos meses: chuvas em excesso, sol escaldante, escassez hídrica onde deveria haver um grande volume de recursos… Toda essa inconstância pode ser atribuída ao El Niño, um dos fenômenos climáticos de que mais se ouve falar no dia a dia.

Infelizmente, as notícias não são das melhores: de acordo com um boletim de monitoramento divulgado pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) em parceria com outros órgãos climáticos, o El Niño deve ficar mais intenso no Brasil ao longo dos próximos meses.

É claro que um fenômeno dessa importância afeta a vida humana em diversos aspectos, sendo um deles a economia – e, mais especificamente, a produção agrícola. E é disso que vamos falar hoje. O primeiro passo é esclarecer: afinal, o que é o El Niño?

Entendendo o El Niño

O El Niño é um fenômeno natural que abrange aspectos oceânicos e atmosféricos no qual ocorre um aumento anômalo das temperaturas do Oceano Pacífico, em especial na região equatoriana do globo.

El Niño

As áreas em vermelho e laranja representam o movimento do El Niño, partindo da costa da América do Sul. Imagem: Reprodução/Imagem do Movimiento Ciudadano frente al Cambio Climático

Ele provoca alterações no transporte de umidade, o que implica variações na distribuição de chuvas em certas partes do mundo. No Brasil, isso quer dizer o seguinte:

  • O Sudeste enfrenta temperaturas acima do normal, sobretudo no inverno
  • O Sul enfrenta fortes chuvas, como as que vêm atingindo Santa Catarina e o Rio Grande do Sul
  • O Norte e o Nordeste ficam com o tempo mais seco, apresentando menos precipitação
  • E o Centro-Oeste passa a apresentar temperaturas bastante elevadas e que contribuem com as queimadas

De modo geral, o El Niño tende a aumentar o calor no verão e diminuir o frio no inverno, o que acontece porque ele aplaca as frentes frias. Assim, as quedas de temperatura são mais amenas, enquanto o ar fica mais seco e começa a circular para baixo. Por consequência, isso dificulta a formação de precipitação.

Apesar de o El Niño não ser consequência do aquecimento global, e sim um fenômeno periódico e natural, as mudanças climáticas podem sim acarretar alterações no seu comportamento – gerando até mesmo resultados difíceis de prever com precisão.

Você quer saber mais sobre o que leva à formação do El Niño? Veja esta verdadeira aula do Nexo Jornal:

O que diz o boletim do Inmet?

O boletim traz diversas previsões, algumas bastante alarmantes. Veja algumas das que mais chamam a atenção:

  • No período de 15 de novembro a 14 de dezembro deste ano, partes da Região Sul e de estados como São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará e Amapá terão condições mais úmidas que o comum.
  • Para dezembro, a expectativa é que os níveis de água no solo passe de 90% – devido, justamente, ao grande volume de chuvas no Sul.
  • Nas outras partes do país, o ar ficará mais seco – com destaque para a região amazônica.
  • Como os níveis de água no solo permanecerão baixos em outras áreas, com poucas chuvas no Nordeste e em partes do Norte, o déficit de recursos hídricos aumentará.

Os efeitos do El Niño intensificado na agricultura

Quando se trata da agricultura, o El Niño traz desdobramentos difíceis de combater (mas não impossíveis). Talvez o exemplo mais comum seja a escassez hídrica, que produz um efeito cascata: quanto menos água há disponível, mais limitada fica a irrigação; quanto menos as culturas são irrigadas, menos elas crescem; isso, por sua vez, impacta diretamente a produtividade.

Embora o maior volume de chuvas nas regiões Sul e Sudeste possa ser benéfico para determinadas culturas, como soja e milho, ele também contribui com doenças que afetam a colheita e aumenta o risco de erosão, enchentes e outros problemas no solo.

Onde a seca fica mais intensa, como no Norte e no Nordeste, é comum haver a perda parcial ou mesmo inteira de colheitas – forçando muitos produtores a replantar parte da safra e, assim, aumentar os gastos (com menos retornos).

Também podemos mencionar o efeito que as altas temperaturas têm em culturas sensíveis ao calor. É o caso, por exemplo, do café e de diversas frutas.

E não dá para não falar do fator que mais afeta a população em geral: o preço dos alimentos, que corre o risco de subir em decorrência da oferta reduzida.

Todos esses fatores nos ajudam a enxergar os efeitos que o El Niño causa – e perceber como ele apresenta riscos não só para a produção agrícola brasileira, mas também para a pecuária, uma vez que ocorre uma forte perda de pastagem para rebanhos.

Como o setor agrícola pode se preparar melhor para o El Niño

Há diversas práticas e tecnologias que os produtores podem adotar para minimizar os impactos do El Niño – e falamos sobre alguns deles com frequência aqui no blog –, como sistemas de irrigação mais eficientes e a escolha certa das culturas de acordo com as condições locais.

A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) também tem algumas recomendações específicas e bastante úteis:

  • Em áreas afetadas pelo excesso de chuvas: realizar a rotação de culturas, escolher sementes resistentes a doenças que surgem em ambientes muito úmidos e monitorar a aplicação de adubo.
  • Em áreas com escassez de precipitação: realizar o plantio direto, escolher culturas mais resistentes à falta de água, plantar somente o necessário (sem exageros) e, claro, monitorar as condições meteorológicas da região.

Diante dessas recomendações, fica claro: apesar de ser impossível escapar do El Niño, é mais que possível mitigar seus efeitos nas plantações.

Você quer saber ainda mais sobre o El Niño?

O El Niño está se comportando de forma atípica… Então queremos terminar o artigo de hoje também de um jeito diferente! Fica aqui o convite para você ouvir o episódio “El Niño – Como evitar a catástrofe climática”, do podcast O Assunto.

No episódio, a jornalista Natuza Nery conversa sobre o fenômeno com Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da USP e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC). O professor explica o fenômeno, como ele impacta as temperaturas, quais são as formas mitigar esses efeitos e de que maneiras as regiões do Brasil são afetadas. Informação nunca é demais, principalmente quando vem de fontes especialistas! Confira:

O El Niño não é novidade, assim como os efeitos que ele causa na agricultura e em tantos outros setores. Aqui, não se trata de lutar contra um fenômeno natural: a ideia é entender esse fenômeno, tomar as medidas possíveis para conter os “estragos” que ele causa e, assim, reduzir os prejuízos (alimentares, financeiros e até humanitários). E cada produtor e consumidor pode fazer a sua parte!

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